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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Durval de Moraes - o "Mão de Onça"

Aos 79 anos, ex-goleiro do Juventus relembra jogada em que Rei deu chapéu em quatro antes de testar para a rede e diz que jamais viu gol igual

Por Márcio Mará Rio de Janeiro


     Por onde passa, Durval de Moraes é obrigado a contar a mesma história há 51 anos. O hoje seguidor da religião das Testemunhas de Jeová virou lenda no dia 2 de agosto de 1959. Nos tempos em que era apenas o goleiro Mão de Onça, do Juventus, foi a última vítima da obra de arte mais perfeita de Pelé, segundo o próprio Atleta do Século 20 e a maioria dos 10 mil presentes na Rua Javari. O gol em que o Rei dá quatro chapéus e testa a bola antes de estufar a rede na goleada do Santos por 4 a 0 só tem registro fotográfico. Mas o filme não sai da cabeça do viúvo de 79 anos, pai de nove filhos, avô de 17 netos, bisavô de 10 bisnetos.

  - Não é porque foi em mim não, mas não vi mais bonito até hoje. Não dá para comparar com qualquer outro. Nem de Maradona, nem de Messi… Achei mais parecido o do Alex, quando jogava no Palmeiras (veja no vídeo abaixo). Ele chapelou um marcador e depois o Rogério Ceni, mas não completou de cabeça e deu balão em menos gente… – afirmou, com autoridade.
    
     Da mesma forma que lembrou a jogada feita pelo meia, hoje no Fenerbahçe, da Turquia, na vitória do Verdão sobre o São Paulo por 4 a 2, pelo Torneio Rio-São Paulo de 2002, Mão de Onça não esquece até hoje os detalhes do golaço do Rei. Aos 36 minutos do segundo tempo, o Santos já vencia por 3 a 0 quando Jair lançou Dorval pela direita. Na altura da meia-lua, ele centrou para Pelé, que vinha em velocidade. O primeiro a levar chapéu foi Julinho. Depois vieram Homero, Clóvis e, por último, Mão de Onça. Estava pronta a obra-prima com quatro chapéus e, segundo Mão de Onça, duas embaixadinhas de cabeça antes de testar para o fundo da rede, ao contrário da reconstituição do lance feita no filme “Pelé eterno”.
  
  - Antes da risca do meio-campo, o Pelé já saiu em disparada. Eu gritei para o Julinho: “Olha o Cão, atenção!”. Eu chamava o Pelé de Cão… Pensei que o Julinho ia cortar de cabeça, mas o Pelé matou no peito, tirou a bola, já o encobriu… Depois foram os outros. Fiquei por último… Quando eu levantei, com a bola lá dentro, o Rei comemorando, aquela gritaria toda no estádio, o Clóvis estava debaixo do gol. Se jogou lá, tentando tirar a bola. Olhei para ele e disse: “Pô, como é que pode esse cara meter um gol assim, dessa maneira?” Ele me respondeu: “Esse aí é o diabo em forma de gente!”. O Julinho ainda falou: “A bola estava no meu peito. Quando vi, sumiu!” – disse o ex-goleiro, por telefone.
     Não é porque foi em mim não, mas não vi  gol mais bonito até hoje”
     Segundo Mão de Onça, Pelé estava naquele dia visivelmente irritado com a perseguição da torcida do Juventus. Mas, após os gols, o estádio inteiro bateu palmas para o Rei. E um fato curioso aconteceu: enquanto discutiam sobre o gol, o ponta do Juventus, Rodrigues, que estava deslocado como lateral-esquerdo, voltou gritando para toda a defesa.

  - Este é o gol mais bonito que já vi! Por que vocês estão tão brabos? Têm é que abraçar o Pelé!

  - Então, vai lá você abraçar! – respondeu o goleiro, ainda inconformado com o lance genial.
     Para piorar a situação, Mão de Onça estava todo sujo de lama. Havia uma poça ali na área por causa das chuvas daquela manhã. O arqueiro contava com ela como aliada para parar a bola…
  - Naquela fração de segundo, pensei em mil e uma coisas. Ameaço que vou e não vou? Bola de poça em água não pula… Minha ansiedade foi senti-la na água. Mas não chegou. Ele a tirou antes e me deu o chapéu. Pelé pensava muito rápido. E fui para a água, com barro e tudo.

     Com ou sem barro, Mão de Onça, único daquela defesa do Juventus ainda vivo, foi um dos que sofreram na mão do Rei. De cabeça, o goleiro, que começou a carreira com 15 anos, diz que sofreu oito gols do maior jogador do planeta. Depois de começar no amador Primavera Indaiatuba, Durval ingressou no antigo Clube Atlético Ituano – não é o Ituano de hoje, frisa. Após breve passagem por São Paulo e Atlético Mineiro, encontrou o seu porto seguro no Juventus. Querido lá, guardou também boas lembranças.




FOTO - Durval de Moraes, o Mão de Onça, com Agnes Dias, segundo ele, sua “neta espiritual”, no Congresso das Testemunhas de Jeová. Ex-goleiro do Juventus está hoje com 79 anos